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Publicações - Quatro Rodas nº 351 de outubro de 1989
A nova fase do BR-800
(páginas: de 79 a 81)


A nova fase do BR-800

Com mil exemplares rodando pelas ruas - a maioria tendo passado por mais de um dono -, o carrinho da Gurgel já não sera um estranho na Transpo.


Luiz Fusco, um dos primeiros compradores, entusiasmado.
Luiz Fusco, um dos primeiros compradores, entusiasmado.

Desde que começou a ser comercializado, em novembro passado, o BR-800 da Gurgel, primeiro carro construído com tecnologia brasileira, enfrentou problemas de reposição de peças, decepcionou quem esperava melhor desempenho e mostrou falhas no projeto - tanto que no meio do caminho voltou a ser revisto pelo seu construtor, o engenheiro João Augusto Conrado do Amaral Gurgel.

Se o percurso foi acidentado na prova das ruas, o mesmo não ocorreu nas curvas das cotações de mercado, onde o BR-800 segue uma rota privilegiada, revelando-se um ótimo negócio para os 8 mil investidores que compraram as 10 mil cotas de ações que financiaram a sua fabricação.

Com base nas sugestões dos consumidores, o projeto melhorou. E o ágio alcança até 100%.

Hoje já circulam pelas ruas e estradas brasileiras cerca de 1.000 exemplares do carro, cuja produção está perto de atingir 200 unidades por mês. Com isso vai deixando de ser um estranho na paisagem, sem contudo perder o poder de atração sobre certos consumidores, como o eletricitário Fernando Padia. Desde o início, ele se envolveu tanto no projeto que até acabou por participar de um comercial de televisao no qual elogiava o baixo consumo do veículo. Fora do vídeo, ele assegura que o carro é econômico mesmo: “Na cidade, faz 18 km por litro e, na estrada, deve fazer até 23...”.

Mecânico nas horas vagas, Fernando elogia também a simplicidade do motor do BR-800 - o que facilita a manutenção - e a garantia de 50 mil km para o motor e de 100 mil km para a carroceria. “Além do mais, fibra de vidro não tem problema de ferrugem.”

E mesmo se tivesse, Fernando não teria tempo de ver seu carro enferrujar. Não chegou a ficar dois meses com ele. Rendeu-se a uma proposta irrecusável e o vendeu pelo dobro do preço que havia pago.

Um ótimo negócio, como ele acredita ser também a compra das ações da Gurgel Motores. “Como o BR-800 é econômico e de fácil manutenção, poderá ser exportado para todos os nossos vizinhos pobres da América Latina”, avalia.

Outro investidor que precisa ser patriota - a bem do próprio bolso - é o eletrotécnico Ubirajara Colman. Ele adquiriu 10 lotes de ações da Gurgel Motores, com a prévia intenção de negociar os carros. Já retirou um e aguarda mais dois para os próximos meses. Até agora. não chegou a dirigir mais que 6 km, a exata distância entre a concessionária e sua casa. “Retirei o carro da agência no sábado e na segunda já tinha vendido.”

Segundo Amaral Gurgel, tanto um quanto outro podem ficar tranqüilos. Tudo está indo conforme o previsto. Ele espera lançar em junho do ano que vem uma van derivada do BR-800 e atingir em seguida a produção de 1.000 unidades por mês dos dois modelos.

Por enquanto, os acionistas são os únicos com o privilégio de comprar o BR-800 de uma das 60 revendedoras autorizadas do país pagando preço de tabela: NCz$ 12.300 no início de setembro, ou seja, entre 60 e 65% do valor do carro mais barato do pais, o Chevette. Aos menos afortunados, recai um ágio de até 100%. Só depois de 1991, quando todos os acionistas tiverem adquirido o carro a que têm direito, o BR-800 entrará livremente no mercado, prevê Gurgel.

Mais de 80% da produção do BR-800 são hoje destinados aos sorteios realizados entre os acionistas. O restante vai para órgâos públicos, como a Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos. Também a Dafferner S.A., uma indústria de máquinas gráficas, comprou dois BR-800 para uso de seu pessoal de escritório e de assistência técnica, “com resultado satisfatório”, segundo o diretor financeiro Marcos Sautino. “A maior vantagem do carro é ser pequeno, fácil de estacionar”, diz.

Sautino: “Fácil de estacionar”.
Sautino: “Fácil de estacionar”.

Marcos também faz algumas críticas. Acha o banco traseiro apertado demais e reclama da trepidação em marcha lenta. “Um dos carros teve também problema sério de freios e ficou três dias parado numa concessionária”, revela.

Silvério Luiz Fusco, proprietário da Acústica São Luiz, é outro usuário entusiasmado. Ele só critica o amortecedor do BR-800 (“um pouco duro”) e a porta traseira, que dificulta o acesso ao bagageiro. Não faz restrições à baixa velocidade do carro, à simplicidade do painel (“assim não tem o que quebrar”) e nem mesmo ao nível de ruído. “Está dentro dos padrões”, diagnostica, com a autoridade de engenheiro acústico.

Para o engenheiro Gurgel, a receptividade por parte do público não poderia ser melhor. “Recebemos muitas cartas com elogios, sugestões e críticas construtivas”, conta. Motivado por elas, Gurgel já mexeu no amortecedor, nos bancos e no sistema de ignição. Com isso ele acredita ter reduzido os defeitos a praticamente zero. “Já temos carros com até 50.000 km rodados sem nenhum problema.”

O corretor Milton José Bonassi, que comprou um BR-800 logo depois do lançamento, teve problema com o superaquecimento do motor. Em menos de duas semanas tinha vendido o carro para a economista Maribel Barazal, que estava justamente à procura de um veículo prático e econômico para ir de São Bernardo do Campo, onde mora, até o centro de São Paulo, onde trabalha.

Logo no primeiro final de semana, enquanto passeava na avenida Paulista, Maribel notou que o motor fervia e a tampa do radiador não segurava a água. Tentou trocá-la em várias lojas, mas não encontrou nenhuma que servisse. Quando a concessionária trocou o motor inteiro do BR-800 de Maribel, a atração pelo carrinho já havia acabado. “Eu sempre esperei um rendimento melhor”, queixa-se.

Adilson de Souza, diretor de seguradora, também achou fraco o desempenho do motor de dois cilindros do BR-800. “Quem está acostumado com carros mais potentes sente que ficou a pé”, compara. Dono de uma Caravan, Adilson também enfrentou problemas, como superaquecimento do motor e o mal atendimento em concessionária. “Experiências desse tipo dão uma esfriada na gente”, diz. Apesar disso, não descarta a possibilidade de ter outro, talvez como o terceiro carro da família. Quanto às ações, está convencido de que fez um ótimo investimento para o futuro. “Não vendi e nem pretendo vender as ações. Acredito nessa indústria”, afirma.


BR-800
  • Início de produção - 1988.
  • Carroceria - Dois volumes, duas portas, tração traseira.
  • Comprimento - 3,19 metros.
  • Peso - 634 quilos.
  • Tanque de combustível - 37 litros.
  • Consumo - 11,49 km/l na cidade, 16,45 km/l na estrada, carregado e 18,62 km/l na estrada, vazio.
  • Velocidade máxima - 107,2 km/h.
  • Aceleração - 0 a 100 em 43,43 s.
  • Vendas - 1.000 unidades em um ano.

  • + Consumo
    Facilidade de estacionamento
    Estepe do lado de lora
    Valor de revenda
    - Desempenho
    Visibilidade
    Espaço interno e de bagagem
    Acesso ao banco traseiro
    Nível de ruído

    BR-800 (lateral)
    BR-800 (frente) BR-800 (traseira)

    SONHO BRASILEIRO
    Quando se formou em engenharia pela Escola Politécnica da USP, João Augusto Conrado do Amaral Gurgel tinha planos nada modestos: fabricar automóveis no Brasil. Começou produzindo minicarros motorizados para crianças e karts de competição, ainda na década de 60.
    No ano de 1969, com a criação do modelo Ipanema, o sonho tomou formas mais concretas. A Gurgel Motores iniciava, assim, a produção de veículos de uso misto, meio utilitários, meio esportivos.
    A fábrica de Rio Claro, hoje com mais de 40 mil metros quadrados de área coberta, foi inaugurada em 1981, na mesma época em que ele tentava materializar outra utopia: o veículo Itaipu E-500, primeiro carro elétrico da América Latina.
    Mas foi com os utilitários das linhas Carajás, Tocantins e G-800 (picape) que a Gurgel se sedimentou no mercado automobilístico. Conquistou clientes fiéis entre órgãos públicos, como policia e corpo de bombeiros, e já exporta para cerca de 45 países.
    Gurgel: Projeto vitorioso
    Gurgel: Projeto vitorioso
    Mas, se o empresário Gurgel poderia ter-se dado por satisféito, o engenheiro não. Afinal, os carros eram fabricados com motor Volkswagen. Assim, em 1986, começaram os estudos para a criação de um veículo “100% nacional”. O projeto foi batizado de CENA - Carro Económico Nacional - e resultou num motor considerado revolucionário, pois dispensa correias e distribuidor.
    O motor foi testado pela primeira vez em 1987, no dia 24 de junho. Mas, para o lançamento oficial do carro, escolheu-se data mais significativa: 7 de setembro - segundo Gurgel, marco da independência tecnológica brasileira.


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