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Publicações - Oficina Mecânica nº 212 Um sonho a menosEXCLUSIVO: Entramos no que resta da "fábrica de sonhos", a "muitonacional" de engenheiro João Amaral Gurgel, fechada desde 1994 Um sonho a menos Na rodovia Washington Luiz, pertinho de Rio Claro, SP, a placa ainda está lá, quase imponente: Gurgel. A marca - sobrenome de seu fundador estampada em 43 mil veículos desde 1969 - parece viva. Até passa a rápida e absurda ideia que o engenheiro João Augusto Conrado do Amaral Gurgel estaria lá trabalhando. E sonhando. Mas, ao chegar ao portão, o mato e uma portaria decadente denunciam a realidade decretada 10 anos atrás, em 1994: trata-se de uma "massa falida". Ao lado de José Carlos Finardi - mais que colaborador de MECÂNICA, um eterno pesquisador da história da industria automobilística brasileira, a ponto de ser o único proprietário de um Democrata Presidente, um carro nacional que nunca chegou às ruas - formamos uma dupla de "compradores". Desde 2001, quando foi realizado um leilão judicial tentando vender sem sucesso a Gurgel de "porteira fechada", compradores isolados tentam arrematar por meio de propostas para o Juíz encarregado da falência, itens ainda existentes na fábrica. Ou o que resta deles. História saqueada Impossível não se emocionar. Galpões fechados e empoeirados, com o teto caindo, abrigam o que resta dos sonhos do engenheiro Gurgel, o de fazer uma indústria exclusivamente brasileira para concorrer com as multinacionais, uma "muitonacional", segundo sua própria definição. O mato encobre os arredores dos sete enormes galpões, inclusive o que resta da pista de testes, onde passavam todos os carrinhos de fibra de vidro, plástico e aço (Plasteel) do engº Gurgel. Já no primeiro galpão, alguns poucos carros, quase todos saqueados (Supermini e Motomachine - este por R$ 6.500 - inacabados, ao lado de um Carajás e três G-800), davam o tom da visita.
Tudo muito distante do final dos anos 80, quando 1.200 pessoas trabalhavam naqueles galpões e se planejava a expansão com mais uma fábrica do Supermini (e sua evolução que nunca saiu dos planos, o Projeto Delta) em Fortaleza, CE. Nos galpões vazios e sujos, parece se escutar ecos dessas pessoas que faziam os jipes, os utilitários e os populares de 800 cc. História fotografada "Posso fotografar? Tem muita coisa aqui, é fácil esquecer". "Claro - responde nosso acompanhante -, pouca gente compra algo, já que o processo e lento, a proposta tem de passar pela Justiça e os preços de avaliação estão muitos altos. Há anos que pedimos uma reavaliação".
Mesmo naqueles escombros, cheios de anos de poeira e poças d’agua de chuvas recentes, pela lente da máquina ainda surgem indícios da genialidade do engenheiro Gurgel. Como o enorme carrossel onde se montavam os Supermini (com duas carrocerias ainda penduradas), prática invenção do dono da fábrica para substituir a tradicional linha de montagem, comum em outras fábricas. Ou restos dos seus protótipos de carros elétricos. Ou ainda os enormes fornos, usados para acelerar a secagem da fibra de vidro de carrocerias, em escala industrial.
Tudo ao lado de pranchetas encostadas há mais de uma década e de onde sairam muitos projetos inovadores. Entre os galpões portas jogadas do Supermini denunciavam a morosidade de se dar um fim digno à lenta agonia do que sobra do sonho de um "carro 100% brasileiro": uma árvore cresceu pela janela de uma dessa portas abandonadas.
"Onde ficava o escritorio do Gurgel?", pergunto. "Ele tinha vários. Um aqui, outro lá no galpão dos motores, outro em Brasília... Parecia estar em muitos lugares ao mesmo tempo" explica o acompanhante. Questiono se o engenheiro teria voltado à fábrica após seu fechamento. "Uma vez só. Chorou o tempo todo e foi embora sem dizer uma palavra".
Um engenheiro João Augusto Conrado do Amaral Gurgel se formou em engenharia em 1949 pela USP e ingressou na industria automobilística.
Trabalhou na Ford e na GM, de onde saiu para montar sua própria empresa. Curiosamente, sua estréia fora das montadoras foi o capô em fibra de vidro de um Fusca 1952 que, preparado por Jorge Lettry em 1956, chegou em segundo lugar nas Mil Milhas em Interlagos. Tanto o material, a fibra de vidro, como a marca, VW, determinariam seu futuro. Em 1969, fundou a Gurgel para fazer o Ipanema, um bugue com mecânica e plataforma de Fusca. Na década de 70, com a fábrica de Rio Claro inaugurada em 1975, desenvolveu o sistema de montar uma estrutura de aço, coberta pela fibra de vidro, abandonando a plataforma do Fusca. Nascia o X-10 e o X-12, depois chamados Tocantins, além dos jipões X-15 e o Carajás (com mecânica dianteira VW AP), sempre com sucesso comercial. Gurgel chegou a ter 75% deste segmento (contra 25% da Toyota). Além disso, fazia utilitários como os G-800, sempre com mecânica Volkswagen.
Tudo ia bem. Mas, o sonho de Gurgel ia além, pois queria fazer um verdadeiro carro popular, como o "Tião", um projeto ainda da faculdade. Pensou no CENA (Carro Econômico Nacional), que surgiu em 1987 como BR 800. Seu motor refrigerado a água se baseava num VW 1600 cortado ao meio, daí os dois cilindros e os 800 cc. Também teve inspiração nos Citröen de dois cilindros, assim como nas motos BMW, das quais Gurgel era fã confesso. Já como Supermini, o carrinho tinha limitações de projeto (como a relação de diferencial muito longo e a tração traseira) e de custo (muitos fornecedores e câmbio importado da Argentina). Gurgel tentava um grande passo no início da década de 90, ampliando sua indústria para o Nordeste, exatamente quando as grandes montadoras lançavam os populares 1.0, com maior aceitação pelos consumidores. Empréstimos governamentais prometidos não foram cumpridos e ajudaram a encerrar uma história de luta e tenacidade, combinada com uma certa teimosia, segundo seus colaboradores mais próximos. Em 1992 a Gurgel pediu concordata, seguida de falência em 1994. Até 1996, alguns funcionários ainda tentaram manter a linha funcionando (comprando peças em lojas com seus próprios recursos). João do Amaral Gurgel, aos 78 anos, continua vivo, mas incomunicável. Segundo fontes de MECÂNICA, que há anos tenta uma entrevista com o engenheiro, ele se encontra doente e mal reconhece as pessoas. Um destino melancólico para um homem que marcou a história do automóvel no Brasil, com sua criatividade, força de vontade e teimosia. Críticas ao carro Não há qualquer dúvida quanto ao perfil visionário do Engº Gurgel. Basta verificar que a discussão do carro urbano, econômico e acessível continua um assunto atual, algo que ele vislumbrava desde os anos 80. Mas sua persistência em produzir o BR 800, depois Supermini, precisamente da forma como queria, custou-lhe severas críticas na época.
Comentários de MECÂNICA na edição 53, de janeiro de 1991:
"O BR-800 é pequeno por fora e também por dentro (...) Como é produzido, com pequeno entreeixos, não permite aos ocupantes sentarem-se com conforto (...) O Gurgel BR-800 traz soluções mecânicas curiosas. E bem difícil encontrar carros desse porte com motor dianteiro e tração traseira por eixo rígido, suspensão traseira por dois feixes de molas em lâminas longitudinais (...) Andando com o BR, nota-se que seu desempenho (113 km/h de máxima e 0 a 100 km/h em 35,8 segundos) não atinge as necessidades atuais".
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