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Publicações - MOTOR 3 nº 7 de janeiro de 1981
Gurgel X-12: Valente e atrevido, como sempre
(páginas: de 24 a 29)


GURGEL X-12

O atrevido veiculo produzido em Rio Claro traz algumas boas inovações em sua linha 81. E continua o mesmo "topa tudo" sobre qualquer terreno.


Gurgel X-12

A pista de Motocross de Interlagos estava á nossa frente. O motor VW 1.600 do Gurgel X-12 girava macio, enquanto afivelávamos os insuficientes cintos de segurança diagonais. O carrinho parecia ronronar, antecipando a brincadeira que se aproximava. Saímos devagar, percorrendo com calma o traçado sinuoso e acidentado da pista, fazendo um levantamento do terreno e procurando memorizar o que se escondia atrás de cada curva, de cada barranco.

Gurgel X-12

Completamos o trajeto; agora será para valer: arrancamos forte, as rodas da frente saltaram no ar logo após a primeira rampa, e lá fomos nós, usando todos os recursos do jipe, procurando propositadamenie os piores trechos, ora vendo as nuvens através do pára-brisa, ora sentindo o chão subir contra as rodas dianteiras, literalmente pulando sobre os obstáculos como um cabrito montês. Depois resolvemos sair da pista e cortar caminho pelo campo aberto, retificando o traçado e atravessando a trilha de motocross em vários pontos, vencendo degraus com bem mais de meio metro de altura. Para terminar, escolhemos alguns trechos e refizemos várias passagens para fins de fotografia.

Gurgel X-12

Voltamos ao ponto de partida e o fotógrafo, que ainda não havia tido oportunidade de assistir às peripécias de um Gurgel em ação, não resistiu: deitou-se no solo e foi olhar o carro por baixo. Depois, perguntou: "Como é que ele consegue fazer tudo isso?"

Gurgel X-12

Ao olhar a parte inferior do X-12 ele já começou a descobrir as razões. Lá não há uma plataforma de Volkswagen mas sim um sólido chassi de aço, construído com tubos de secção quadrada com uma polegada de espessura, formando uma treliça, ou "gaiola", de alta resistência contra impactos. Essa estrutura de aço é posteriormente escondida pelo plástico reforçado com fibra de vidro, dentro do sistema desenvolvido pela Gurgel e denominado plasteel. O chassi e a carroçaria formam um único monobloco virtualmente infenso a torções, que sobe até a linha de cintura como uma forte barcaça, sem usar parafusos - os únicos estão nos pontos de fixação de componentes mecânicos, na amarração do suporte do pára-brisa e nas tampas de porta-malas e cofre do motor.

Ele também pôde ver os sistemas de suspensão do X-12, independente nas quatro rodas, com amortecedores hidráulicos telescópicos especiais, apropriados para o serviço pesado. Na frente há uma suspensão tradicional da Brasilia, mas com uma diferença fundamental na fixação: em lugar de ser presa no centro com quatro parafusos, transmitindo o momento de força maior para a "cabeça" da plataforma, ela é fixada nas duas extremidades da barra, em encaixes próprios existentes no chassi monobloco. Com isso, o esforço é distribuído para os lados e absorvido pela estrutura rígida do veículo. Na traseira há facas longitudinais e molas espirais desenvolvidas pela própria empresa, com número de espiras e diâmetro adequados às operações fora de estrada. As facas (elementos estruturais laterais) estão agora mais espessas e mais fortes. Completam o sistema dois limitadores de curso para a cambagem variável das rodas traseiras, cujo trabalho aparece com nitidez quando se observa de fora um Gurgel trafegando sobre terrenos bem irregulares.

Motor: Gurgel X-12
Acesso ao motor VW 1.600 realmente não é dos mais fáceis.

Ao olhar o X-12 por baixo o fotógrafo pôde ver também a forte placa de aço que protege a suspensão dianteira, uma garantia contra tocos ou casas de cupim quando o jipe abre seu caminho em meio ao mato, e as lâminas de aço que protegem igualmente a transmissão e o motor traseiro. Pôde ver ainda a quase inexistência de balanço (zonas mortas, inúteis num jipe, que se projetam adiante e atrás dos eixos), fator que permite ao veículo oferecer elevados ângulos de ataque e de fuga (respectivamente 63 e 41 graus) e superar rampas de inclinação acentuadas sem bater a frente na entrada ou raspar a traseira na saida.

"Mas não tem tração nas quatro rodas", disse-nos então o fotógrafo, completando seu exame da parte inferior do utilitário. Realmente, o Gurgel não usa esse recurso, e isso o torna até certo ponto surpreendente. Não por ele fazer o que faz, já que isso é obrigação em um veículo destinado ao uso em qualquer terreno; mas sim pela facilidade com que ele executa seu trabalho, sem qualquer recurso extra. Perdão. Há um recurso extra: o selectraction, nome complicado e difícil de pronunciar para um dispositivo bastante simples e fácil de usar. Trata-se de um bloqueio seletivo das rodas traseiras, acionado individualmente pelas duas alavancas que ladeiam o freio de estacionamento em qualquer veículo Gurgel. Cada uma delas, ao ser pressionada, vai travando progressivamente a roda traseira do lado correspondente e suas funções são múltiplas. Por exemplo, para fazer "cavalos de pau" ou curvas de raio bem curto, basta esterçar o volante para o lado desejado e pressionar conjuntamente a alavanca que segura a roda interna: o jipe, nessas situações, chega a girar quase em torno de seu próprio eixo, como um compasso. Mas, brincadeiras à parte, o selectraction tem grande valor em atoleiros ou quando uma das rodas perde tração por qualquer motivo. Nesses casos basta travar a roda que está patinando ou girando em falso, compensar a tentativa de curva ao volante e sair do aperto com toda a tração atirada sobre a roda oposta. Em barrancos ou encostas de montanhas, quando o carro tem seu centro de gravidade deslocado e começa a andar de lado como cavalo manhoso, trava-se ligeiramente a roda mais baixa, equilibrando a rotação e mantendo uma linha reta sem problemas. Em um uso mais simples e mais constante, vê-se que é bastante cômodo segurar o carro pelas alavancas de bloqueio, quando se é obrigado a esperar um semáforo abrir em uma ladeira.

Porta-malas: Gurgel X-12
Porta-malas pequeno é totalmente ocupado pelo pneu sobressalente.

Mas se tudo falhar e o motorista se enfiar em real enrascada com seu X-12, resta o recurso final: na frente do carro há um guincho manual, com cabo de aço de 25 metros, sistema de catraca, capaz de tirar o carro ou mesmo erguê-lo por uma encosta mais íngreme, desde que haja um sólido ponto de apoio para fixar o cabo.

CONSUMO E DESEMPENHO

Retiramos o X-12 ainda novo na fábrica da Gurgel em Rio Claro, SP, e fizemos todas as medições antes que ele atingisse os primeiros 1.500 quilômetros de vida. Em condições, portanto, que prejudicam um pouco o consumo. Rodando em cidade anotamos média geral de 8,0 km/litro, com marcas parciais que oscilaram entre 7,4 km/litro em trechos de tráfego pesado e 9,0 km/litro em avenidas expressas. Fora de estrada nossas medições indicaram média de 7,9 km/litro. Em rodovias a média geral foi de 11,1 km/litro, que pode ser erguida quando o carro for mais rodado; viajando perto de seu limite de velocidade o consumo foi de 9,6 km/litro; acompanhado a vazão sem preocupações com velocidades constantes anotam os 10,9 km/litro; e buscando manter entre 80 e 90 no velocímetro - regime em que ele trafega tranqüilo e seguro - a marca foi de 12,8 km/litro.

Dois recursos de grande valia para um utilitário:
Guincho manual: Gurgel X-12
o guincho com cabo de aço de 25 metros e
Camburão: Gurgel X-12
o camburão com 20 litros
de reserva de combustível.

O modelo X-12 tem tanque de 36 litros e um camburão para mais 20 (segundo a fábrica, porque nós só conseguimos colocar 19,8 litros nele). Esse total de 56 litros dá ao X-12 autonomia de mais de 600 quilômetros em estrada e de cerca de 400 quilômetros fora dela. Quanto ao camburão, durante nossos testes nós o enchemos em três postos diversos, sem qualquer problema. A fábrica, por sua vez, lembra que a resolução 511/77 do Contran se refere a veículos que receberam tanques suplementares após saírem das linhas de montagem, situação em que estão proibidos de serem abastecidos. Os modelos X-12 da Gurgel, porém, saem de fábrica com o camburão e estão homologados dessa forma desde antes dessa resolução ser assinada e publicada.

O desempenho do X-12 é adequado a um utilitário do tipo jipe. Sua velocidade máxima real foi de 115,5 km/horários na melhor passagem, sem capota e com dois adultos a bordo. Com a capota servindo de freio aerodinâmico e quatro pessoas a bordo registramos 104,5 km/hora. As retomadas e arrancadas também são típicas de um veículo para qualquer terreno. Afinal, o X-12 usa motor VW 1.600 com carburação simples e relação de marchas igual à da Brasilia, mas o diferencial tem redução de 4,375:1 (modelo usado no VW 1.300), o que pode ser traduzido como mais força transmitida às rodas e menor velocidade final.

A estabilidade do modelo sobre asfalto não é das melhores. Deve ser esclarecido que a própria configuração estrutural do X-12, com seu chassi largo e bem apoiado sobre suspensão dura e amortecedores especiais, concorre para o fato de que não é fácil conseguir tombar um deles em condições normais. Mas em curvas feitas de modo mais esportivo a massa traseira se desloca lateralmente, fugindo ao raio ideal de tomada, e nessas ocasiões a cambagem variável atrás, tão útil fora de estrada, se mostra pouco adequada. Claro que sempre há o recurso de ajudar a tombada com o uso do selectraction, mas isso requer aprendizado e prática.

Em rodovias abertas, os golpes de ventos laterais ou os deslocamentos provocados pela passagem de veículos pesados são acusados pelo X-12. Era de se esperar. Com suas linhas retas e o velame que é sua capota, a reação não poderia ser diferente. Mas também deve ser consignado que o carrinho resiste bem aos golpes, em velocidades de até 100 km/hora.

Os freios do jipe agora trazem discos na frente, melhoramento que há muito era aguardado. Um utilitário, especialmente para qualquer terreno, passará bom tempo de sua vida trafegando sobre locais instáveis, lama ou mesmo cruzando pequenos cursos d'água. Assim, os freios a disco são uma real necessidade do ponto de vista da segurança. Com eles o X-12 1981 logrou deter-se em espaços menores nas frenagens de emergência, mas nessas situações ainda se constatam fugas laterais e desvios da trajetória.

Ainda quanto à segurança deve-se dizer que os cintos da frente deveriam ser do modelo três pontos. Os atuais, torácicos apenas, ainda têm contra si o fato de serem muito longos e deixarem a fivela de fixação no meio do peito do usuário. Unindo o painel ao túnel central há uma útil placa em fibra de vidro, que serve de suporte e esconderijo para o extintor de incêncio; o espaço existente atrás dela, porém, deveria ser fechado, para evitar que algo possa rolar do lado direito do assoalho para trás da pedaleira do carro, causando uma situação indesejável para o motorista. E as placas metálicas que cobrem os pontos de fixação das correias que abrem as portas têm cantos muito vivos, podendo ocasionar cortes em pessoas que raspem seus braços inadvertidamente.

Interior: Gurgel X-12
Painel simples, volante correto, bancos bastante anatômicos.

No interior, o espaço é bom para os ocupantes da frente e fraco para os de trás. O X-12 tem 96 cm de altura do banco ao teto na frente, onde a largura útil interna é de 136 cm, e 85 cm atrás, com largura de 108 cm no assento. Sua capacidade ideal é de quatro pessoas, sendo que as duas da frente dispõem de 861,7 dm³ cada, e as de trás tem 280 dm³. O acesso é bastante simples para o compartimento anterior, não tão simples atrás. Já a operação de tirar ou colocar a capota de lona é complicada e meio trabalhosa; mas a vedação oferecida sob chuva é incomumente boa.

Os bancos dianteiros receberam novo desenho para a linha 81 e estão mais anatômicos, oferecendo melhor encaixe ao corpo; também deixaram a fixação por borboletas e agora correm sobre trilhos, como em carros convencionais. Outras alterações estão nas entradas de ar para o motor, agora dotadas de telas de proteção contra impurezas, e na proteção ao cabo da bateria, finalmente coberto.

CONCLUSÕES

Em inicio de dezembro um Gurgel X-12 com capota de lona - versão mais barata da linha - custava Cr$ 387.133 com motor a gasolina. Opcionalmente pode receber as rodas brancas mais bonitas, tamanho 5,5" x 14" (as originais são de aro 15), vestidas por pneus tipo cidade e campo. A fábrica continua dando aos compradores garantia de 100.000 quilômetros para o monobloco, que é virtualmente imune à ferrugem. E este é sem dúvida um atrativo a mais para o divertido, robusto e versátil utilitário, cujo desempenho fora de estrada acaba deixando qualquer motorista mal-acostumado e exigente demais.

O X-12 continua sendo o menor utilitário produzido no Brasil: seu comprimento total é de 3,31 m (o Búfalo mede 3,40 e o Fiat 147 pick-up está com 3,63 m). A largura é de 1,60 m, entreeixos de 2,04 m e altura de 1,56 m, com bitolas de 1,35 m na frente e 1,40 m atrás. O vão livre do solo, que tem boa participação na facilidade com que o carro supera obstáculos, é de 33 cm com as rodas de aro 15 e de 31,5 cm com as opcionais, aro 14. Seu peso total é de 798 quilos, com 57,6% (460 kg.) sobre o eixo traseiro e 42,4% (338 kg.) sobre o dianteiro.

PCF

Sem capota: Gurgel X-12
Sem capota, vento no rosto, o X-12 se transforma em verdadeira curtição.


CONTRAPONTO

OLHOS FECHADOS, EM ÊXTASE, A 100 POR HORA

Outro dia, pela milésima vez, perguntaram-me: "qual o melhor carro nacional?" Sempre respondo, "depende". Depende, é claro, de para que utilização. Aí, veio o clássico aperto: "Mas se você tivesse de ter um só e tivesse de utilizá-lo para tudo, anos seguidos, qual você escolheria?" Ainda consegui sair um pouco pela tangente, dizendo que, se continuasse morando em minha caótica São Paulo, escolheria um determinado modelo, recém-lançado, que modificaria, assim mesmo, bastante. Mas que se morasse no interior, ou na orla marítima, especialmente do Rio para cima, só teria uma escolha: um Gurgel. Meu interlocutor olhou-me espantado - e olhe que ele era um engenheiro mecânico, com mais de vinte anos de indústria automobilística. "Um Gurgel?!" O espanto era real, genuíno - como o seria mais tarde, rodando como passageiro no valente jipinho, durante parte de nossa avaliação. A genial rusticidade hiperfuncional continua intata - e lembro-me do primeiro Ipanema, com plataforma e mecânica Volkswagen, de mais de 10 anos atrás, assustando os motoristas parados num monumental engarrafamento de trânsito na via Dutra, ao sair pela lateral esquerda, atravessar o canteiro, sair pelo acostamento daquele lado, subir um tremendo barranco e atravessar quatro quilômetros e meio de mato, valas, barrancos e buracos, para depois, esperando o tráfego que já se engarrafava também daquele lado, voltar á pista vazia de mão correta e ir para o Rio, chegando lá pelo menos duas horas antes do que qualquer um dos engarrafados. Isto num tempo em que todo mundo andava a bem mais de 120, que era a velocidade máxima do Ipanema. O X-12 de hoje é mais lerdo, já que sua aerodinamica piorou muito em relação ao Ipanema. É também mais barulhento. Mas em todos os outros parâmetros, o X-12 é infinitamente superior ao antigo - que ainda hoje seria extremamente bom. Na fábrica, há um bastão de beisebol com que qualquer visitante pode marretar carroçarias ainda não pintadas. Muito grandalhão já torceu o pulso tentando - nenhuma carroçaria jamais amassou ou quebrou. O chassi básico, de treliça em tubos de aço de secção quadrada, é imensamente resistente. Ele não verga, funcionando como uma estrutura monocoque de Fórmula-Um, possibilitando às suspensões traseira e dianteira trabalhar sem sair da geometria ideal. Já vi Gurgel bater em F-100, de quina, de frente, e levar tranqüilamente a melhor. Mas, de tudo de que me lembro desses geniais carrinhos, o que mais me fascina é sua capacidade de imediatamente me deixar vinte anos mais moço. Não é um carro para machões, e sim para crianças de todas as idades. É um farrista sensacional, que pede para ser dirigido sem pára-brisa, debaixo de chuva, corcoveando pelo mato ou catando resquicios de onda, agulhas de água salgada no rosto, a companheira de biquini, em pé, segurando-se no "Santo Antônio", olhos verdes fechados, a 100 por hora, em puro êxtase.

Apesar disso, se tivesse de ter um, faria algumas modificações para torná-lo ainda mais meu: dois amortecedores por roda, a gás, jogos de rodas e pneumáticos para estrada (radiais baixos e largos), campo (tração) e praia (alta flutuação), motor e transeixo Corvair ou Porche, freios idem, pacote anti-ruído em toda a carroçaria. Ele seria então rápido e seguro em longas distâncias, silencioso em passeios noturnos tranqüilos - e ainda mais farrista do que já é. Um perigo, sem dúvida.

JLV



Publicações >> Motor 3Página atualizada em: 18/09/2022 03:41