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Gurgel - O homem que sonhava

Ele queria uma indústria automobilística genuinamente nacional e trabalhou por isso durante quase 30 anos, enfrentando moinhos visíveis e invisíveis. Sua saga, hoje, é apenas uma história triste

POR WALTER ARRUDA
FOTOS SÍLVIO PORTO/PRENSA TRÊS


"Automóvel não se fabrica, compra-se. É coisa para multinacionais." O desafio de Gurgel com os automóveis começou em 1949, quando apresentou, em um exame da Escola Politécnica da USP, um projeto de carro. A frase acima foi proferida por um professor que quase o reprovou. Começava a história do engenheiro que foi aos Estados Unidos buscar know-how na indústria automobilística americana, trabalhou nas maiores fábricas do planeta e publicou artigos em revistas especializadas americanas aos singelos 27 anos.

Foi na América que obteve o diploma de Engenheiro Automobilístico pelo General Motors Institute. Depois, trabalhou na GM do Brasil e, mais tarde, na Ford. Em seguida participou do Geia (Grupo Executivo da Indústria Automobilística), programa instituído pelo então presidente Juscelino Kubitscheck.

Em 1958, quando o filho estava nascendo, João Augusto Conrado do Amaral Gurgel pediu demissão da Ford, onde trabalhava, depois de uma discussão com o vice-presidente da companhia sobre a insistência do executivo em não trazer carros para o Brasil.

A Ford queria permanecer só no mercado de caminhões. A alegação era de que um país com renda per capita de US$ 129 por ano, em média, não podia consumir carros. Por mais que Gurgel argumentasse, essa posição era irredutível. A resposta do jovem engenheiro foi definitiva: "Vou trabalhar em uma fábrica nova. Acho que vai se chamar Gurgel. Tenho US$ 50 mil para começar".

Na verdade, o início da saga desse brasileiro empreendedor se deu com a Moplast, dedicada a luminosos e painéis. Paralelamente, ele iniciou a fabricação de carros com o chassi e o motor do Fusca. Em 1969, criou, em São Paulo, a Gurgel Indústria e Comércio de Veículos, com quatro funcionários e produção mensal de quatro automóveis. Era o começo de uma história não tão longa, mas absolutamente heróica, que deixou um saldo positivo de 40 mil carros produzidos e vendidos.

Expectador e personagem da história, Gurgel relembrou, em uma de suas últimas entrevistas, concedida à jornalista Carolina Andrade, em 1994, os tempos iniciais do governo JK: “Quando Juscelino fez o projeto da indústria automobilística no Brasil, eu ajudei. Trabalhei com o Almirante Lúcio Meira e toda aquela turma que formou o Geia. Eu era, naquele tempo, assessor da presidência da Ford. O projeto inicial do Juscelino era o da nacionalização progressiva por peso. De 20% no primeiro ano até 90% ao fim de cinco anos. As multinacionais achavam que não podíamos fazer velocímetros, não podíamos fazer rolamentos, e a nacionalização nunca ia chegar a 100%. Baseados nessa idéia, construímos um projeto de indústria automobilística que pode ser carroça ou não ser carroça, mas que gerou muito emprego e, por meio dela, foi possível também gerar a indústria - de autopeças. Tudo isso foi feito até 1980. O Brasil ia crescendo na produção de maneira bárbara. Chegamos a 1,16 milhão de carros. Agora, devido a essa história de globalização da economia — eu não gosto nada dessa palavra — temos de abrir as portas. E destruir tudo aquilo que foi feito pelo Juscelino."

LINHA DO TEMPO

Em 1980, foi lançada a pedra fundamental da fábrica de veículos elétricos Gurgel, em Rio Claro (SP). O primeiro carro sairia da linha de montagem um ano depois; e o sucesso o tornaria famoso em toda a América Latina, para onde foi amplamente exportado.

Em 1983, Gurgel assina um acordo de cooperação com a Volkswagen, para atuarem conjuntamente na fabricação e na montagem de utilitários Gurgel, em países que recebiam veículos Volkswagen no regime CKD (completamente desmontados).

Em 1985, é criada a Gurgel-Tec, com apoio da Financiadora de Estudos e Projetos (Finep), órgão do Ministério da Ciência e Tecnologia. Em 1986, é fabricado o Carro Econômico Nacional (Cena), depois denominado BR-800. A empresa vive um período de grande efervescência: a fábrica é ampliada; o número de funcionários cresce; e é construído o Centro Geral de Usinagem (CGU).

O ano se encerra com uma revolução: em dezembro, é apresentado ao mercado o motor de dois cilindros contrapostos, com 800 cilindradas, um marco da Gurgel.

Em 1987, é lançada a Campanha de Abertura de Capital, e 10 mil lotes de ações são colocados no mercado. Dois anos depois, a Gurgel adquire uma área de 650 mil metros na Grande Fortaleza (CE), onde planeja construir sua segunda fábrica.

É a partir daí que começam os problemas, muitos deles tendo como causa o não cumprimento do protocolo de intenções por parte dos governadores Ciro Gomes, do Ceará, e Luiz Antonio Fleury Filho, de São Paulo.

A empresa se abala e inicia vertiginosa derrocada. Em 1993, a Gurgel pede concordata. Apesar disso, no mesmo ano ganha o 70 Troféu Europa à Qualidade, conferido pelo Editorial Office e pelo Trade Lider’s Club, que congrega 12 mil associados em 112 países.

Em 1994, um episódio muito estranho, do qual o Dr. Gurgel conservou todos os documentos, culmina com a decretação da falência da empresa, misteriosamente levantada em seguida. Mas o que o empresário chamou de "perseguição" continuou e, há 10 anos, foi decretada a falência total da companhia.

O sonho acabou morrendo junto com Gurgel, que dedicou quase 30 anos de sua vida ao projeto do carro nacional. De qualquer forma, muitos de seus produtos continuam rodando por aí, conduzindo a história do heróico empreendedor. E, algum dia, toda a história será contada...

Fonte: Revista Unidas


material enviado por João Carlos Bajesteiro


Publicações >> DiversasPágina atualizada em: 08/09/2022 23:15